segunda-feira, 11 de julho de 2011

Diário de uma Menopausa:

Episódio I - O espelho

Patrícia Elizabeti era assim, se achava chique, linda e jovem e  pensava e pensava. Aprendera a pensar na vida desde cedo, pois diziam que quem não começa a pensar desde cedo, na velhice não aprenderá. Não sei bem qual a finalidade disso, deve ser para quando ficarmos velhos pensar  o quanto o tempo passou. Tudo bem, cada um com seu cada um. Naquela tarde, Patrícia Elizabeti estava pensativa por demais. A descoberta tardia do início da velhice chegara para ela que, sentada à beira do caminho, não vira o tempo chegar, passar e ir. E ele se foi à francesa. Nada podemos contra as ações do tempo, pensava, enquanto observava o rosto flácido refletido no espelho também envelhecido. 
Patrícia Elizabeti enxergou rugas, uma pele enrugada, manchada pela ação solar de um país tropical “abençoado por Deus e bonito por natureza”, como já dizia a música. Mas raios solares aumentam as manchas na pele. Continuava pensando, tentando justificar a si mesma que o tempo passara. Tempo, tempo, tempo... Não somos senhores do tempo, nem da vida, nem cuidamos do planeta, nem de nós mesmos... Pensamentos. Naquele instante, a mulher sedutora, com belos olhos cor de mel, longos cabelos negros como ébano, rendeu-se ao reflexo disforme no espelho da sala. A  visão atravessou-lhe as feições e traduziu-se em velhice. A lágrima que insistia em rolar pela face parou no meio do caminho, assustada com as fortes batidas de um coração amedrontado pela sensação de finitude, limitação e imposições da idade, que avança e avança.
 Ah, o tempo! Descobrir-se envelhecendo, ou envelhecida, não foi algo bom para ela. Alguém denominou de melhor idade, mas com certeza esse alguém não tinha artrose, menopausa e uma porção de “ites” nomeando suas patologias (artrite, sinusite, labirintite etc). Ela sentia dores ao acordar, ao dormir, ao fazer sexo, e este não deveria mais ser selvagem, correndo o risco de travar toda a coluna vertebral. Desenvergaduras! Sem contar as benditas alterações hormonais que mudam o humor. Uma TPM elevada ao cubo, coisa que me dá arrepio só de pensar.
 Ah, os sinais da velhice! Mas todos os sintomas eram de fase inicial, antes da chamada melhor idade. Talvez pudesse ser idade intermediária, ainda não velha, mas nunca mais jovem...
Ela continuava a fazer conjecturas sobre os reflexos do tempo em sua vida que, pensava ela, graças a Deus, avançava. Melhor ser velha que estar morta, concluía.  Ainda não fizera tudo que havia proposto a si mesma. Faltava plantar a árvore talvez, mas lembrou-se do abacateiro que acabara de plantar no quintal, entre a goiabeira e o caquizeiro. Então, faltava conhecer Portugal, tomar leite batido com manga verde, viajar de navio (não sabendo nadar!) voar de helicóptero (mesmo sendo claustrofóbica!) – superação de seus medos mais pavorosos e depois escrever um livro. Escrever e publicar um livro. Pensou em enganar o tempo. Plástica talvez! Haja grana! 
 Parou de se olhar no espelho, recostou-se no sofá e adormecera no fim da tarde, roncando, de boca aberta, cansada pelo tempo gastara pensando sobre o tempo que ainda teria. Morfeu abraçou-a suavemente. Pronta pra sonhar. Mas o sonho será uma próxima narrativa, afinal ser narrador de uma aspirante à velhice faz de mim um narrador na idade intermediária, e isso cansa.

Krika 11/07/2011

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